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[Atualização]: A Lança & o Graal


1 DE MARÇO DE 2025 E.V. – A Lança & o Graal


Faz o que tu queres há de ser tudo da Lei.


A pintura A Lança & o Graal (acrílica sobre tela) da artista Luciana Vasconcelos foi encomendada para a nova edição do livro homônimo, em fase de construção. Luciana também é a autora das capas de meus últimos livros: Daemonium: a Quimbanda no Renascer da Magia; Ganga: a Quimbanda no Renascer da Magia; Daemonium: a Quimbanda & a Nova Síntese da Magia; e Wanga: o Segredo do Diabo. Ela também é a autora de muitas capas e imagens que aparecem nas edições da Revista Nganga.

 

A imagem retrata a energia mágica gerada na Missa Gnóstica, que tratei com profundidade no livro Safira estrela: A Magia Sexual de Aleister Crowley, Suplemento 1.

 

A Missa Gnóstica (Liber XV), criada por Aleister Crowley em 1913 e.v., constitui o rito central da Ordo Templi Orientis (O.T.O.) e sintetiza, em uma liturgia altamente simbólica e dramática, a fusão entre misticismo, teurgia e magia sexual. Concebida no contexto do ecletismo esotérico do início do Séc. XX, ela reflete tanto o interesse de Crowley pela liturgia da Igreja Ortodoxa Oriental quanto sua profunda imersão nos mistérios da Ordem Hermética da Aurora Dourada, no gnosticismo cristão primitivo e nas práticas do tantrismo hindu e tibetano. A Missa Gnóstica não é apenas um culto religioso, mas uma operação mágico-teúrgica cujas raízes remontam a uma longa tradição de teurgia sacramental, onde o corpo e o espaço litúrgico são transubstanciados em matrizes de energia mágica. Em termos históricos e esotéricos, ela se insere na linhagem de rituais iniciáticos que ligam os Mistérios de Elêusis aos sistemas hermeticistas renascentistas e às práticas mágicas do Séc. XIX, como os ritos maçônicos e martinistas.

 

A Tríade hermeticista: Aub, Aud e Aur como arquitetura da energia mágica

 

Para compreender a energia mágica da Missa Gnóstica, é necessário compreender o conceito de luz tripla, herdado da Ordem Hermética da Aurora Dourada. Esse conceito divide a luz espiritual em três aspectos distintos: i. Aub, luz lunar e astral, reflexiva e passiva, identificada com a luz ilusória do plano astral. Ela é a energia mágica dos fenômenos psíquicos e das práticas de feitiçaria. Ii. Aud, a luz ígnea e volátil, a verdadeira força mágica que Crowley relaciona diretamente à kuṇḍalinī-śakti. É essa luz que alimenta a prática da magia sexual e os ritos de Thelema, inclusive a Missa. iii. Aur, a luz solar equilibradora, síntese harmonizadora da dualidade, representando a luz espiritual transcendental e a iluminação mística.

 

Essa tripla luz estrutura a energia que percorre a Missa Gnóstica. Cada palavra vibrada, cada gesto, cada interação entre Sacerdote e Sacerdotisa, cada invocação eucarística e cada movimento ritualístico serve como circuito canalizador dessa força, convertendo o espaço-tempo ritual em um condensador energético, onde microcosmo (indivíduo) e macrocosmo (cosmos) se encontram e fundem.

 

Simbolismo sexual como tecnologia teúrgica

 

A Missa Gnóstica é uma estrutura simbólica construída sobre o simbolismo da união hierogâmica entre princípios opostos: Hadit e Nuit, Sol e Lua, Falo e Útero, Espírito e Matéria. Essa união é performada liturgicamente através da interação entre a Lança Sagrada (a Vontade Solar Fálica do Sacerdote) e o Cálice do Graal (o Ventre Cósmico da Sacerdotisa). Trata-se de uma atualização ritual do Mysterium Coniunctionis alquímico, onde o Solve et Coagula se manifesta não apenas no plano material, mas como uma fusão de opostos no próprio corpo sutil do praticante.

 

Esse simbolismo sexual não é decorativo, mas sim operativo. Segundo Crowley, os arcanos da magia sexual do IX° O.T.O. estão embutidos de forma velada na Missa Gnóstica. Cada carícia da Lança, cada gesto de exposição da Sacerdotisa, cada pronúncia de fórmulas sagradas é um dispositivo psicodinâmico destinado a despertar, concentrar e dirigir a força mágica interna (kuṇḍalinī) tanto do oficiante quanto da congregação.

 

Gnose sinestésica e corpo místico coletivo

 

A força mágica na Missa não é apenas uma experiência individual do oficiante, mas é compartilhada pela congregação através daquilo que Crowley chamou de entusiasmo energizado, uma atualização do conceito grego de entheos — o estado de possuir a divindade dentro de si. Isso é alcançado através da combinação de palavras vibradas, música ritualística, aromas específicos, imagens arquetípicas e posturas corporais. A sinestesia mágica cria um estado alterado coletivo, em que o templo e os corpos dos presentes formam uma alma-grupo, uma matriz de energia que amplia e reflete a força mágica invocada.

 

A Eucaristia, ao final, é o momento culminante dessa operação. Ao consumir o Pão e o Vinho consagrados como Corpo e Sangue do Deus Solar, cada participante assimila simbolicamente a própria força mágica. Ele não é apenas um espectador, mas torna-se um corpo sacramental, um microcosmo consagrado. Ao declarar Não existe parte de mim que não seja dos Deuses, o praticante reconhece em si mesmo a natureza divina imanente — a verdadeira gnose alquímica, onde o chumbo da personalidade é transformado no ouro da consciência divina.

 

Aspectos tântricos e hermeticistas: kuṇḍalinī e prāṇa

 

Crowley conecta explicitamente a força mágica da Missa com a kuṇḍalinī-śakti da tradição tântrica, a serpente de fogo enrolada na base da espinha. A Sacerdotisa, ao dar três voltas e meia no templo antes de saudar a tumba do Sacerdote, encena ritualmente o despertar da kuṇḍalinī, que ascende até a coroa, unindo céu e terra, espírito e matéria. Esse mesmo movimento é visto na tradição hermeticista como a subida da serpente de Malkuth a Kether, e no tantrismo como a ascensão da śakti do mūlādhāra a sahasrāra.

 

Além disso, o prāṇa, o alento vital, é continuamente trabalhado ao longo da Missa, sobretudo no Credo, onde se declara fé em um Ar que alimenta todos os alentos. Isso conecta a Missa à ciência esotérica do prāṇāyāma, onde a respiração é a técnica central para controlar e concentrar a força vital, algo essencial tanto na magia thelêmica quanto no yoga tradicional.

 

Disciplina e perigo: a necessidade de treinamento e purificação

 

É importante frisar que, segundo Crowley, a manipulação dessa energia mágica demanda disciplina e concentração extremas. Sem esse controle, a energia invocada pode ser caótica e destrutiva, manifestando-se como obsessões neuróticas, colapsos psicológicos ou sobrecarga espiritual. Daí a insistência no treinamento preliminar de concentração e meditação, e no conhecimento e conversação com o Sagrado Anjo Guardião, que atua como filtro e guia dessa força.

 

A Missa Gnóstica, portanto, não é apenas um ritual religioso no sentido convencional, mas uma tecnologia esotérica de transmutação da consciência, onde símbolos, palavras e gestos são dispositivos para ativar circuitos ocultos da psique e do corpo sutil. Ela é um campo unificado de magia sexual, gnose e misticismo, sintetizando o Ocidente hermeticista e o Oriente tântrico em uma única operação.

 

Portanto, ao estudarmos a energia mágica na Missa Gnóstica, não estamos lidando apenas com uma curiosidade litúrgica de um culto esotérico. Estamos diante de uma epítome ritual de toda uma cosmovisão espiritual que sintetiza inúmeros elementos culturais do gnosticismo e teurgia a alquimia e cultos de mistérios, do imaginário metafísico sexual do Ocidente e do Oriente.

 

A Missa é uma chave-mestra de iniciação e transfiguração espiritual, um rito que condensa e atualiza a tradição mágica ocidental no contexto do Novo Aeon de Thelema. É a dramatização litúrgica do Verdadeiro Casamento Alquímico, que gera, nutre e consome a própria força mágica do Cosmos no corpo do praticante.

 

O livro A Lança & o Graal se aprofunda nos mistérios hieráticos da Missa Gnóstica propondo uma adaptação do ritual para uma celebração eucarística individual ou em casal.


Amor é a lei, amor sob vontade.


Frater AHA-ON777

 
 
 

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